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TEXTO 29 IPÊ: A Mente aprisionada

10/12/2021

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           Durante a atual pandemia do novo coronavírus, muitos desafios vieram se colocando diante de nós. Dentre eles, pode-se destacar a adaptação ao isolamento social, a prática de uma nova rotina, mais restrita, forçando-nos a permanecer mais tempo em casa, trazendo-nos a vivência do medo constante de alguém que amamos, ou de nós mesmos, sermos infectados pelo vírus. Por si só, todo esse contexto já é bastante inquietante, mas, direcionando o olhar para os indivíduos que possuem um funcionamento psíquico prevalentemente obsessivo, é possível observar algumas particularidades.
            A neurose obsessiva pode ser compreendida como uma neurose na qual “[...] a interdição principal e núcleo (…) é a de contato, daí o nome 'medo do toque'” (FREUD, 2012, p. 54). O sujeito obsessivo se vê preso diante de uma cadeia de ideias intrusivas, repetitivas e angustiantes, encontrando nos comportamentos compulsivos o único modo de lidar com elas, tentando anulá-las. O obsessivo acredita (ao mesmo tempo que, em contatos frustrantes com a realidade, duvida) ter uma borracha mágica, com a qual ele poderia apagar tudo de desagradável que passasse em sua mente, pois, o que ele pensa, ele acredita que se tornaria realidade. Em princípio, alguns poderiam achar que isso é uma grande vantagem: já que o que é pensado se realiza, a solução é só pensar em coisas boas! Porém, aí está o sofrimento do sujeito: as ideias intrusivas aparecem predominantemente com conteúdos negativos, sendo sentidas como um sofrimento que precisa ser eliminado com urgência.
            Observo que é comum que o obsessivo se sinta culpado por tudo de ruim que acontece em sua vida, e logo se condena; é seu mais cruel algoz. “É desnecessária uma ameaça de castigo externa, pois há uma certeza interna (uma consciência) de que a transgressão ocasionará uma intolerável desgraça” (FREUD, 2012, p. 54). É como se sua mente vivesse acorrentada, impedida de voar e se expressar de modo criativo e livre. O que será encontrado se o sujeito se lançar nessa liberdade? Que desejos apavorantes são esses que ele precisa ocultar a custo da própria paz mental?
            A ideia intrusiva passa pela sua mente e o sujeito se assusta; ele precisa então pensar em algo bom ou fazer algo que pareça anular essa ideia ruim. O problema é que, além desse mecanismo, raramente o obsessivo consegue fazer isso uma vez só: permanece a sensação de que não foi realizado de modo correto e suficiente, e precisa ser feito ou pensado de novo. E de novo. E de novo. E mais uma vez. Atos sentidos como perda de tempo, que geram uma verdadeira exaustão mental, mas que são vistos como a única maneira que o sujeito encontra para se livrar temporariamente do que o atormenta. Em “Totem e Tabu” (1912-1913), Freud (2012, p. 56) descreve que “as proibições obsessivas trazem consigo formidáveis renúncias e limitações da vida”.
            Pensando em termos do Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC), pode-se considerar que este apresenta sintomas que o sujeito consegue, sem muita dificuldade, esconder de outras pessoas de sua convivência, sendo vivido silenciosamente por muitos anos sem que ninguém saiba, até que, devido à crescente gravidade, o sujeito busca ajuda. Devido à presença das preocupações intensas, dos rituais e das ideias obsessivas de culpa, o TOC pode ser muito confundido com outros transtornos, como os de ansiedade, os depressivos e os alimentares (APA, 2014).
            Atualmente, devido à pandemia da COVID-19, o sujeito com predominância do funcionamento obsessivo precisa enfrentar ainda mais desafios: como não ser inundado por mais ideias apavorantes de tragédias e contaminações? Como lutar contra algo que antes estava “só” em sua mente e que ele podia fazer uso da realidade para se questionar, mas que agora é a realidade e o cotidiano de muitos outros? Manter distanciamento, higienizar-se constantemente, proteger-se contra todo perigo que vem do exterior que pode ser mortal para si e para quem ama: como vivenciar tudo isso sem recorrer aos sintomas, sem acreditar que o que o salvará é um ambiente estéril, sendo que este, na verdade, é exatamente o oposto, é aquele em que não há vida, potencialidade e crescimento. Será que o obsessivo se permite entrar em contato com sua potência e vitalidade sem se sentir destruído por elas?
            Um grande desafio se impõe! Com os agravamentos contextuais como de uma pandemia causada por um vírus altamente contagioso, como o novo coronavírus, as pessoas com tais funcionamentos de predominância obsessiva merecem olhares e cuidados atentos. Que aqueles que sofrem da “doença do tabu” (FREUD, 2012, p. 53) possam buscar ajuda e encontrem terrenos de fertilidade em suas mentes, percebendo que até mesmo aquilo que é considerado perigoso, contagioso e destruidor tem espaço para existir sem causar tanto mal. Renunciando à fantasia onipotente de controle dos objetos internos e externos e acreditando nas próprias capacidades de lidar com o imprevisível e as frustrações, o sujeito obsessivo pode, aos poucos, entrar em contato com o novo, com o transformador. Entendo que a psicanálise se refere justamente a isso, ou seja, à possibilidade do encontro entre analista e analisando gerar o nascimento do novo, de capacitar o analisando a descobrir seus recursos para entrar em contato com o que o assusta e a transformar em liberdade aquilo que o aprisiona.
 
Agradeço ao Departamento Científico do IEP por oferecer a possibilidade aos alunos de também terem um espaço de expressão de suas reflexões.
 
 
Referências bibliográficas:
American Psychiatric Association (APA). Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5). 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
 
FREUD, S. Totem e Tabu (1912-1913). In: FREUD, S. Totem e Tabu, Contribuição à história do movimento psicanalítico e outros textos (1912-1914). Sigmund Freud - Obras Completas, v. 11, 1. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2012,  p. 13-244.
 
 
 
Imagem:
“Criança geopolítica observando o nascimento do novo homem” - Salvador Dalí, 1943, óleo sobre tela.
 
 
Natália Palomares. Psicóloga clínica (CRP: 06/150493), formada pela Universidade de Ribeirão Preto – UNAERP. Aluna do 2º ano do curso de Especialização em Teorias e Técnicas Psicanalíticas do IEP. Contato: natalia.palomares@hotmail.com
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