Essa afirmativa de Freud nos coloca diante da possibilidade de navegarmos mentalmente por mares nunca navegados.
Quantos relatos me foram comunicados: “Fiquei assim de uma hora para outra.” “Nunca pensei que pudesse sentir isso.” “Sentir isso é muito ruim.”
Enfim, podemos ver a angústia materializada nas expressões faciais, no tom de voz, na respiração alterada, pedindo ou depositando na pessoa do analista a responsabilidade de tirar esse mal.
Dentre as angústias que são comumente apresentadas podemos constatar que a perda de controle, a baixa resistência à frustração e projeção da cura fora de si mesmo se sobressaem de maneira especial.
No entanto é a possibilidade que temos no processo analítico de desintoxicar conteúdos tóxicos e ressignificá-los, já que são nossos, e a realidade não muda e sim nosso olhar sobre ela.
Enfrentamos o desafio de como dizer ao nosso paciente que não vamos curá-lo, na medida em que, muito comumente é a idealização do paciente em relação ao analista que motiva a procura da análise.
O processo de desidealização exige tempo e sensibilidade permeados pela perspicácia de antever a condição interna do paciente.
Tarefa difícil essa, bem como, captarmos o nível de excitação mental do paciente, ou seja, se podemos avaliar que está dentro de um nível aceitável que possibilita insights, uma vez que Freud nos alerta para observarmos o “Princípio da Constância” isso implica a tendência do aparelho psíquico em manter a quantidade de excitação num nível baixo ou pelo menos a mais constante possível, ultrapassar esse limite invariavelmente resulta na descarga através de sintomas (Freud, 1996b).
Temos angústias e conflitos que são particulares, próprios da nossa subjetividade, da nossa história, da maneira como vivemos e sentimos nossas experiências emocionais.
Hoje temos um medo que nos é comum, esse inimigo invisível, que nos ludibria, se transforma, se altera, se esconde e nos ameaça, parecendo estabelecer uma competição com algo desconhecido que temos e que se constitui uma das feridas narcísicas da humanidade: Temos uma mente inconsciente.
Assim essa impossibilidade de ter ainda conhecimento e, portanto, a segurança de estarmos protegidos desse inimigo nos deixa no escuro.
O escuro pode causar medo, incertezas e despertar ruídos internos que estavam sendo “abafados” ou protegidos pelas defesas.
O que fazer diante disso?
O caminho que comumente percorremos junto aos nossos pacientes na experiência de estarmos juntos é permeado por investigação, escuta, continência e disponibilidade.
Na tentativa ou na função de despertarmos ou fortalecermos a condição de aceitação e enfrentamento dos nossos pacientes em relação a sentimentos ou realidades que causam sofrimento, objetivamos ajudar a criação de recursos internos ou utilizar os que eles já tinham e não se apropriavam deles.
Assim, também podermos nos apropriarmos dos nossos recursos internos facilitando a esperança de estarmos fortalecidos diante da possibilidade de adoecer.
Referências:
Freud, S. (1996a). Leonardo da Vinci e a lembrança de sua infância. Coleção Standard. Ed. Imago: Rio de Janeiro, RJ. Trabalho original publicado em 1910.
Freud, S. (1996b). Para além do princípio do prazer. Coleção Standard. Ed. Imago: Rio de Janeiro, RJ. Trabalho original publicado em 1925.
Gay, P. (1989). Freud uma vida para o nosso tempo. Denise Bottman (Trad.). Ed. Companhia das letras: São Paulo, SP. Trabalho original publicado em 1988.